MISSÃO EUROPA
Finalmente a missão alcançara seu destino. Após sete anos se aproximavam do satélite de Júpiter, Europa. O melhor candidato do Sistema Solar para se encontrar vida realmente extraterrestre. Marte e Vénus haviam sido uma decepção e qualquer forma de vida nativa que houvessem passado pelas intensas explorações de que foram alvo estariam agora mortas pelo intenso trabalho de terraformação de que eram alvos.
Era a maior espaçonave já construída. O estaleiro onde a montaram não ficava nem na Terra. Orbitava a Lua. Uma nave daquele tamanho era impossível de vencer a força gravitacional terrestre. Em vez de virem direto, viajaram primeiro para o Sol, o contornaram e usaram sua força gravitacional para lança-los até seu objetivo.
Enquanto olhava para o satélite gelado jupiteriano se perguntava se não teria sido melhor ficar em Vênus. Uma estação orbital enorme de onde diariamente saiam naves que espalhavam microrganismos dentro de suas nuvens sulfurosas. Eles um dia tornariam aquela réplica cósmica do inferno habitável para seres humanos. Como piloto treinado seria muito útil por lá. Mas o fascínio de explorar algo completamente desconhecido venceu e eis ele aqui.
A imensa nave se colocou em órbita geoestacionária com o satélite. Ficaria sempre do lado oposto ao voltado para Júpiter. Uma estratégia para mitigar os danos que o imenso campo magnético causava. Mesmo assim ele impunha sérias limitações à missão. O principal era no campo das comunicações. O sistema de chips que eram implantados no cérebro no nascimento e que funcionavam como os antigos celulares eram quase inúteis aqui. Serviam apenas armazenar informações, sons e imagens, não para transmiti-las ou recebe-las.
Isso era algo tão incrustado na raça humana que todos os candidatos tiveram que realizar um treinamento de um ano com seus SPC (Sistemas Pessoais de Comunicação) desligados. A maioria que desistiu foi por causa disso. Não ele.
Finalmente se sentia livre, sem aquelas vozes e imagens aparacendo do nada em sua mente. Adorava não ter toda a informação que precisava para realizar o que quer que fosse disponível no momento que pensava nela. Se sentiu tão a vontade sem seu SPC que quase foi reprovado pelo setor de Psiquiatria.
Finalmente começaram os preparativos do veículo que iria explorar o imenso oceano que ficava sob a crosta de gelo. Era quase uma cópia dos submarinos do século XX da Terra, com cem metros de comprimento, vinte de altura e quinze de largura. A principal diferença era a capacidade do casco externo se aquecer até uma temperatura de cerca de 500°C.
Isso permitia que a nave atravessasse o gelo, tanto para submergir quanto para emergir. Eram três destes acoplados a espaçonave. Apesar de Europa ser um satélite até pequeno, um pouco maior do que a Lua, sua gravidade impedia que os barcos uma vez lançados fossem recuperados. Cada uma das naves iria fazer uma circunavegação diferente. Ele estava incumbido de explorar o hemisfério norte. As outras iriam uma pelo hemisfério sul e outra navegaria pelo eixo longitudinal, indo de Pólo a Pólo.
As naves foram lançadas e aterrissaram ao mesmo tempo. A cerca de um quilometro uma das outras. Imediatamente seus cascos aquecidos começaram a derreter o gelo. A proa cerca de 250°C mais quente para que o barco descesse inclinado. Depois de treze km de crosta chegaram a água líquida. Nada que pudesse se comparar a exuberância dos mares terrestres. Apenas um verdadeiro oceano negro, parcialmente iluminado pelas luzes dos três submarinos. Mas dentro dos barcos a atividade era frenética. Os doze tripulantes conferindo todos os sistemas e equipamentos.
Analisando a composição e temperatura da água. Os resultados dos sonares para determinar a profundidade. Ficaram imóveis por cerca de doze horas. Lançaram várias sondas tanto na crosta quanto para o fundo. Marcariam o lugar de seu encontro daqui há um ano.
Logo de começo era tremendo o entusiasmo nos três submarinos. Esperavam encontrar algum indício de material orgânico próximo das fontes térmicas no solo. Mas já as primeiras análises revelavam que a água era rica de materiais necessários a vida, inclusive com uma oxigenação muito acima do esperado. Menos de uma hora abaixo da crosta foram envolvidos em um colossal cardume de peixes, semelhantes a sardinhas. Logo atrás dele um enorme Leviatã de mais de cem metros de comprimento. Nadou por duas horas por entre os barros, esquecendo sua comida para analisar estas estranhas criaturas. Nadava rente a eles e estendia suas cumpridas membranas frontais até o casco.
De repente soltou um lindo canto. Muito parecido com os das baleias da Terra. O primeiro impulso dos técnicos dos três navios foi analisar o som e tentar reproduzi-lo. Seu gosto por antiguidades finalmente lhe ajudou. Inspirado por Contatos Imediatos de Terceiro Grau mandou que a nave emitisse três notas, desse um tempo e depois as emitisse de novo. Em menos de dois minutos o imenso animal começou a emitir as mesmas notas.
Ele mandou os técnicos emitissem um som de satisfação. Essas notas, naquela ordem, passaram a significar os visitantes. E esse foi o início de uma língua que foi sendo criada pelos animais de Europa e pelos técnicos dos submarinos. E de uma descoberta ainda mais incrível do que a de vida extraterrestre. A de uma vida inteligente além da humana. Com um pequeno grande detalhe: UMA VIDA INTELIGENTE! Todos os seres vivos formavam uma única entidade pensante!
Durante os 365 dias que a missão durou eles descobriram que o responsável era um "parasita" que invadia as células. Formava um túnel entre o núcleo e a membrana citoplasmática. Três flagelos adentravam o núcleo e três saiam da célula, muitas vezes se comunicando com os flagelos que saem de outras células. Mas uma sempre ficava livre.
O contato entre elas não ocorria pelo método da vida terrestre ou mesmo das outras estruturas neurais dos animais de Europa, os neurotransmissores. Mas sim através de ondas de rádio. Era até compreensível, pois o enorme oceano Europiano não era afetado pelo campo magnético avassalador de Júpiter devido a enorme crosta de gelo que o separava da superfície. Só uma vez o "Cérebro de Europa" conseguiu infectar um ser terrestre.
Um (camundongo) fêmea. Assim como as outras criaturas do satélite ela passou a não depender do macho para reproduzir e a só parir fêmeas. Isso assustou tanto os técnicos dos submarinos que estes de comum acordo decidiram redobrar os cuidados de esterilização e jogaram todas as camundongas para fora do barco.
Toda a vida era organizada em Europa. Nenhuma criatura crescia em sua população em demasia, nem sofria quedas abruptas. As presas pareciam se jogar nas bocas de seus predadores e estes pegavam apenas o suficiente para se satisfazerem. Um todo que até podia se comunicar com os humanos através da linguagem musical que foi desenvolvida durante o ano das missões.
Apesar de vários dos técnicos estarem quase em estado de euforia, ele, o capitão de uma das naves, aquele que teve a ideia original da comunicação, sentia-se exasperado com tudo aquilo. A simples ideia de que ele poderia a qualquer momento se tornar uma peça de uma engrenagem, sem qualquer opção, sem nenhuma liberdade. O sonho de Stálin e de Hitler tornados reais! Ele que se imaginara passar anos navegando o Grande Oceano Europiano, contava os dias para que sua missão acabasse. Agora que preparava para submergir sentia um grande alívio. Lógico que pedir para sair agora acarretaria um enorme retrocesso para a sua carreira, teria que esperar meses até voltar a Terra, mas valia a pena.
Era tão estranho estar separado do todo. Tão difícil ser sozinho. Sentia-se completamente desamparado. E o que eram eles? Apenas mil células. Só o suficiente para manter o pensamento coletivo claro. O que os humanos nunca perceberam é que desde cedo podiam perceber seus sentimentos. Mesmo onde estavam podiam lê-lo como a um livro. A ansiedade era grande, mas tinha que se controlar. O plano era esperar ele voltar para seu planeta mãe. Na massa musculosa onde estava poderia espalhar através das bactérias de suas eliminações vários missionários de uma nova Grande Unidade. O futuro era glorioso!
Escrito por Aristoletes da Silva
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